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Tentei Ficar Bêbado com Kombucha

Assim como o resto das ideias péssimas e idiotas em que embarquei para a VICE, decidi tentar encher o caneco com kombucha, uma bebida "milagrosa" que consiste em uma gosma de leveduras e bactérias.

Todas as fotos por Jared Oban.

Quando o kombucha virou febre em São Francisco em março passado, dava até pra pensar que o chá seboso que todo mundo estava bebendo tinha propriedades mágicas. Lembro-me de estar numa fila de uma lojinha de produtos saudáveis enquanto a moça do caixa fazia todo mundo esperar contando como tinha vencido o câncer bebendo um 3 litros de kombucha caseiro todo dia. A mulher pra quem ela estava contando essa lorota estava encantada, já lotando o carrinho com todas as cores da bebida sem glúten. Esse é o tipo de pessoa que eu odeio.

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Então, eu escapei da loucura do kombucha, assim como escapei da febre da couve-de-folhas, do açaí, da água de côco, da quinoa e do resto. Sabe esses caras malucos por saúde estilo Rob Lowe em Parks and Recreations? Eles podem ir pro inferno fazendo marcha atlética. Eu prefiro morrer.

Kombucha tem sua própria lista de qualidades paliativas, que engloba desde aumentar a imunidade até tratar a AIDS. Não acredito em nada disso. Os benefícios para a saúde viriam da gosma de leveduras e das bactérias da bebida, mas não existe nenhuma pesquisa real que confirme isso. Pelo contrário, no começo do ano, uma grande marca de kombucha tomou um processo por propaganda enganosa por dizer que a bebida tinha "poderosos antioxidantes", mesmo não havendo uma prova que seja disso.

Dito isso, o kombucha tem pelo menos uma qualidade redentora: ele é levemente alcoólico.

E esse fato já foi atacado antes. A marca mais popular de kombucha foi tirada das prateleiras da Whole Foods porque supostamente ultrapassava 0,5% de volume alcoólico, o que coloca isso no mesmo grupo da cerveja sem álcool segundo uma classificação baseada no Volstead Act, a legislação que apoiou a Lei Seca nos EUA. Por volta da mesma época, Lindsay Lohan – que estava em condicional e não devia beber – falou que seu teste de álcool deu positivo por causa do kombucha. Se isso funcionou pra Lindsay (supostamente), achei que poderia funcionar para mim também.

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E assim, como o resto das ideias péssimas e idiotas em que embarquei para a VICE, decidi tentar encher o caneco com kombucha.

Como a maioria das pessoas sãs, eu nunca experimentei kombucha antes. Ou era isso que eu achava. Durante minhas pesquisas, descobri que existe uma bebida ucraniana de pão de centeio equivalente ao kombucha chamada Kvass. Kvass tem um teor alcoólico baixo similar ao do chá fermentado, um fato que passou batido pelos meus pais, que me davam essa porcaria pra beber desde que eu tinha três anos. (Como outros aspectos da minha origem soviética, isso explica muita coisa.)

Como moro em São Francisco, encontro de 5 a 40 lojas de comida saudável nos arredores da minha casa. Fui até a mais próxima, onde o funcionário simpático, tatuado e barbudo nem piscou quando perguntei qual marca de kombucha deixava mais bêbado. Ele explicou que, apesar das marcas grandes estarem sob escrutínio por seu teor alcoólico, marcas menores conseguiam passar despercebidas. "Na verdade", ele me explicou, "o processo de fermentação acontece depois que a bebida é engarrafada. Quanto mais tempo ela fica fechada, maiores são as chances de ficar mamado".

"Ele apontou para a data de validade na tampa. Era aquele mesmo dia. 'Essa é a melhor aposta, essa garrafa está aqui faz tempo'."

Ele riu disso; depois, disse: "Quando a coisa é potente, você sente na hora". Ele me entregou uma garrafa com um rótulo preto que dizia "PROIBIDO PARA MENORES DE 21 ANOS" e apontou para a data de validade na tampa. Era aquele mesmo dia. "Essa é a melhor aposta, essa garrafa está aqui faz tempo." Comprei a garrafa, assim como 14 outras, nenhuma das quais eu pretendia terminar – boa parte das quais, aliás, eu pretendia vomitar. Igual no segundo ano do colégio.

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Em casa, organizei minha compra em fileiras, com as embalagens variando em tamanho, cor e sabor. Algumas pareciam latas de cerveja, e uma era de rolha. As outras pareciam garrafas de remédio antigas e cheiravam a remédio também.

Quando tirei a rolha da primeira e dei uma cheirada, percebi que eu ia precisar de um dicionário para achar sinônimos suficientes para "rançoso" e "desagradável". Um negócio nojento mesmo. Tomei um golinho e isso imediatamente me lembrou do Gatorade deixado destampado num galpão, lentamente se enchendo de poeira e insetos (e onde alguém jogou uma pastilha de mictório também). Tomei mais alguns goles e decidi que isso tinha o exato gosto do que era: chá mofado com sabor artificial.

Ainda assim, depois de ter passado por um período de pobreza regado a uísque vagabundo, eu já tinha experimentado coisa muito pior só pra ficar bêbado. Isso com certeza era melhor que várias cervejas artesanais metidas a besta que fui obrigado a experimentar desde que me mudei para São Francisco. Engoli o máximo possível em um único gole e arrotei forte. Até agora, tudo bem.

Passei para a variedade em lata, delicadamente rotulada "Rose Black". Abri uma, esperando vapores nauseantes, porém não senti nada. Um único gole me mostrou imediatamente que isso não era fermentado nem alcoólico. Na verdade, a bebida era deliciosa e tinha gosto de chá com pétalas de rosa. Entretanto, não senti o impacto. Nada. Isso não ia me embebedar, e infelizmente tive de seguir em frente.

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Fui para outra marca, essa com sabor "cereja picante". O cheiro era o certo: a carbonatação chegou ao meu nariz, grossa e intoxicante, provocando uma careta. Dei um gole de leve e imediatamente me arrependi de ter confiado no meu palato nasal. Eu conseguia sentir distintamente o pó de cereja que eles usaram para disfarçar o que claramente deveria ser uma ducha vaginal. Cuspi e coloquei essa de lado.

Abri mais umas garrafas de vidro e fui experimentando. A maioria dos sabores não era tão ruim, variando de xarope ácido para poça de urina na calçada. E, depois de ter bebido alguns mililitros, eu já começava a sentir uma cepa de bactérias diferente bombardeando meu intestino. Segundo o rótulo de uma das garrafas, cada porção oferecia bilhões de microrganismos. Acho que você não deve misturar tantas bactérias assim.

Decidi parar de brincadeira e beber a garrafa de rótulo preto vencida que o cara da loja tinha me indicado. Um gole já me mostrou que essa era decididamente alcoólica. Dei três boas goladas. As sementes de chia davam uma textura engraçada.

Na hora seguinte, tentei dar uma de machão e beber o máximo que meu estômago pudesse aguentar de cada garrafa. Os sabores mais leves desceram rápido, e eu já sentia meu estômago inchado.

Depois de beber quase um litro, resolvi sair para fumar e verificar meu nível de intoxicação. O sol e o cigarro me deixaram um pouco tonto. Apesar de estar um pouco confuso, eu não estava nem perto de estar de pileque, muito menos bêbado. Eu me sentia um colchão d'água cheio de gases, o que, pensando agora, não é tão ruim. Soprei no bafômetro e consegui um grande zero. Eu não estava bêbado.

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Resolvi dar mais alguns amigos para as bactérias do meu estômago me deixarem bêbado: investi nas garrafas marrons. O último gole de cada uma era uma mistura arenosa e viscosa, como catarro de fumante. Uma sensação incômoda na minha garganta, que eu já estava sentindo antes, se tornou mais intensa. Eu tinha de mijar.

"Imaginei 15 líquidos diferentes balançando no meu estômago, pequenos navios de guerra bacterianos disparando canhões protoplásmicos minúsculos numa campanha para estabelecer a dominância das minhas tripas."

Para minha desconfortável surpresa, depois de virar quase dois litros de kombucha, minha urina estava escura – e, apesar de não ter comido nada naquele dia, alguma coisa estava borbulhando dentro de mim num longo e nojento peido molhado.

Depois de tudo aquilo, percebi que, apesar de não estar bêbado, eu tinha de vomitar. Me acostumei com o gosto rançoso e putrefato bem rápido, mas uma sequência de arrotos continuava me trazendo uma nova combinação de sabores. Imaginei 15 líquidos diferentes balançando no meu estômago, pequenos navios de guerra bacterianos disparando canhões protoplásmicos minúsculos numa campanha para estabelecer a dominância das minhas tripas. OK, talvez eu estivesse um pouco bêbado. Soprei no bafômetro e vi a tela mostrar 0,01. Esse pequeno sucesso me fez sair correndo para o banheiro a fim de esvaziar meu bucho em fúria na privada – de cabeça.

A primeira onda de vômito veio facilmente, com uma meia garrafa e um punhado de sementes de chia indo para o vaso. Apoiei a cabeça no assento. A batalha dentro de mim tinha dado uma pausa. Nada mais estava saindo. Meu hálito estava acre e bolorento, e minha língua parecia peluda. Pensei por um momento se era possível pegar micose na boca.

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Tentei beber o resto das garrafas que tinham sobrado e percebi que o experimento tinha acabado. Meu corpo já tinha absorvido o suficiente daquele líquido fétido, e o bafômetro mostrava zero de novo. No total, consumi quase 3 litros de kombucha e consegui não vomitar a maior parte disso. Traduzindo para álcool de verdade, isso equivale a pouco menos que uma única cerveja. E eu vomitei. Sou muito peso-pena mesmo.

Virei o resto do kombucha numa garrafa vazia de água e descobri que uma das garrafas continha um naco grande de uma coisa marrom e viscosa. Era uma colônia de bactérias e levedura, enquanto outro pedaço disso provavelmente estava boiando em algum lugar do meu corpo. Tentei tirar essa ideia da cabeça.

Quando tentei dormir naquela noite, meu corpo tinha virado uma fábrica de gás. A cada 20 minutos, eu emitia uma nuvem fétida e ardida para um lado ou para o outro. No dia seguinte, no trabalho, passei um quarto do expediente cagando e outro quarto trabalhando do meu celular, enquanto peidos molhados e ensurdecedores sacudiam o único banheiro decente do escritório.

Qual o veredito final de beber quase 3 litros de chá fermentado, atingindo um impressionante nível alcoólico de 0,01? Não recomendo.

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Tradução: Marina Schnoor.

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