Dor, marcas na pele e frustração: ser peituda é um baita trampo
Todas as fotos são da Larissa Zaidan/VICE.

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Feminisme

Dor, marcas na pele e frustração: ser peituda é um baita trampo

Mulheres brasileiras contam as dificuldades de carregar seios grandes.

“Você tem um tamanho maior?”

Não importa a loja, sempre peço um tamanho maior do que normalmente uso por causa dos meus seios grandes. Não preciso dizer que a resposta para essa pergunta não é positiva na maioria das lojas de shopping que arrisco comprar alguma blusa bonita ou um sutiã. Aos 13 anos, como se fosse de um dia pra outro, tive que jogar fora meus sutiãs da Minnie Mouse e passar direto para lingerie de mulher adulta. Arames, alças largas e bojos reforçados passaram a integrar o meu vocabulário na hora de fazer compras com a minha mãe. Detestava comprar sutiã, assim como detestava o jeito que eles deixavam meus seios espremidos e levantados até demais.

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Uma das primeiras lembranças que tenho dos meus peitos é de usar uma regata na escola e o professor de Geografia me pedir para colocar o casaco, porque o decote estava “demais”. Envergonhada com a bronca, passei o resto da adolescência usando camisetões largos para disfarçar o volume. Foi na faculdade que passei a usar algo mais decotado. Até hoje, peço opinião de amigas ou do meu namorado quando me arrisco a usar regatas ou blusas decotadas. Tudo que você coloca sobre seus seios grandes corre o risco de virar algo ultrasexy ou inapropriado. Pior quando você resolve cobri-los – parece que você é uma matrona.

Sim, claro, nós mulheres temos o direito intransferível de usar o que bem entendermos, na hora que quisermos e onde for possível. Concordo com isso. Só que a moda não me ajuda também. Raramente acho um sutiã abaixo dos 80 reais que me sirva. Blusinhas ficam apertadas na parte de cima. Sair às compras parece um déjà vu da minha adolescência, quase sempre voltando frustrada por não encontrar nada do meu tamanho.

"Ter peito grande é cavar dois buracos na areia para você deitar de bruços. É dar quase 200 reais em um sutiã que serviu mais ou menos. É frustrante, pesado, porém dá para tirar uma onda."

Apesar de hoje as mulheres cada vez mais questionarem os padrões esperados para o corpo feminino, não me vejo representada em lugar nenhum nesse movimento. Não que ache que seja obrigação de alguém representar meus seios grandes, mas às vezes parece que só existem dois tipos de mulheres: as sem peito e as que colocaram prótese. O pessoal parece ter uma visão distorcida do peitão. Seios grandes, infelizmente, também obedecem às regras da gravidade e não ficam de pé como o pessoal acha que fica. Quer me deixar com raiva? É só falar do teste do lápis que determina se seu peito é caído ou não.

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Embora os meus seios chegarem numa sala antes do que mim mesma, tenho que admitir que gosto deles de vez em quando. Eles preenchem o sutiã, dando uma forma bonita no meu corpo. Às vezes me dão uma certa sensação de poder de persuasão. Eles também boiam na água, o que sempre me arranca umas risadas. Outras amigas e conhecidas peitudas não têm a mesma sorte que a minha e sentem dores nas costas. Na TPM então, esquece. Eles ficam o dobro do tamanho e doem como nunca. Tenho vontade de criar um campo de força com minha mente para ninguém chegar perto de mim.

Sabendo que eu não sou a única mulher que sofre com as glândulas mamárias superdesenvolvidas, entrevistei outras garotas para falarem do sofrimento silencioso que só quem tem seios fartos enfrenta.

"Seios grandes é dor, gasto, característica étnica, conflitos e no fim é lindo."

Ketyanne dos Santos Silva, 28 anos, assistente jurídica

Tamanho 52

“A primeira coisa que vem em mente quando penso nos meus seios é dor. Não posso carregar coisas muito pesadas e nem pude carregar minha filha quando ela nasceu por causa disso. Desde sempre, minha relação com eles é de rejeição. Passei anos sem usar uma regata por vergonha de exibi-los. Já deixei de ir em festas, casamentos e formaturas porque não encontrei vestidos que coubessem por causa deles. Meus seios me impedem de fazer muitas coisas. Penso mil vezes antes de fazer uma academia porque não acho um top de ginástica que me serve. Não vou em encontros às escuras porque tenho vergonha. A maior humilhação é correr atrás do ônibus e ver as pessoas do ponto rindo de mim porque eles balançam. Praia? Não pisei durante anos da minha vida. Hoje até sou mais desconstruída em relação ao meu corpo e meus peitos, mas pretendo tirá-los assim que possível.”

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"Seios grandes são um incômodo, mas também dão gosto. Como algo pode ser um conflito e um conforto ao mesmo tempo?"

Vanessa Vieira dos Santos, 33 anos, publicitária

Tamanho 48/50

“Os meus seios cerceiam um pouco meus movimentos. Quando saio pra uma caminhada ou corrida, é dois tops no mínimo para segurá-los. Quando era mais nova, era quase impossível usar um decote. O problema não é chamar atenção, mas o incômodo que essa atenção me traz. Agora, já adulta, uso roupas coladas e decotes, mas na adolescência usava tudo em camadas para disfarçar o volume. Nunca tive dor nas costas por causa deles, mas penso futuramente em reduzir por questão de facilidade. Agora acho que eles estão bonitos. Durante minha TPM eles ficam inchados e doloridos e preciso recorrer à dois sutiãs pra deixar eles imóveis.”

"Queimar meu sutiã seria um sonho lindo, uma liberdade e kg a menos de dor e falta de ar. Espero um dia (em breve) vencer essa sociedade que me oprime e me impede de me sentir bem com meus peitos/corpo."

Thamu Candylust, 32 anos, tatuadora

Tamanho 48

“Meus seios me dão dores na coluna há 15, 20 anos, ainda mais por causa da posição que tenho de ficar na hora de tatuar alguém. Acho que os benefícios deles são mais pros outros, esteticamente, do que pra mim. Eu adoraria não precisar usar sutiã, mas é impossível. Sem contar que quando estou com dor, não consigo nem trabalhar. Muitas vezes pensei em reduzir o tamanho deles, mas não sei até que ponto concordo com esse tipo de modificação estética – prefiro outros tipos de modificações. Hoje, faço academia para diminuir a gordura deles e massoterapia para amenizar a dor.”

"Ter peito grande é como virar uma vitrine humana. O tempo todo alguém vê e comenta. É como não ter privacidade desde desenvolver peito até o fim da vida, mas mesmo assim amo essas duas bolas grandes de gordura que sustenta meu corpo."

Thais Mayume Carvalho Higa, 31 anos, radialista de formação de editora de vídeo

Tamanho 52/54

“Eu adoro meus peitos, mas óbvio que foi uma luta pra conseguir isso. Começa que na 5ª série um dia eu fui dormir despeitada e acordei com um peito só. Um deles se desenvolveu mais rápido. Pensa que na época o Mamonas Assassinas tava fazendo muito sucesso então eu virei praticamente a Maria Monoteta. Só fui gostar deles mais velha e tenho muita dificuldade de achar um sutiã em conta que caiba eles. Peço pra uma amiga comprar na gringa que é mais fácil de achar. A gente vive numa sociedade que hiperssexualiza o peito, embora ele não ser um ponto alto no Brasil – que curte mais bunda. Qualquer decote que você coloca se transforma em um decotão. Você sempre tá muito sexual ou muito não sexual.”

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"Ter peito grande é carregar peso e dor diariamente."

Kelly Rosa, 36 anos, professora

Tamanho 54

“Uso tamanho 54 e não acho nada pra mim. A última vez achei um sutiã aleatoriamente nessas revistinhas tipo Avon. Comprei três e só um deu certo. Não uso sutiã, só top. Desisti. Penso em tirar, mas preciso emagrecer antes e não tenho vergonha na cara. Eu sou estranha em geral então acredito que eles não sejam a primeira coisa que olham. Eu não tenho traumas. O top faz minhas costas doerem menos. Tenho dores frequentes e o sutiã causa uma dor muito chata.”

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