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Politică

Debate com ‘rinha’ esquenta corrida eleitoral com direito a fuga de Bolsonaro

Ex-capitão tomou puxão de orelha de Marina Silva e deixa estúdios sem responder pergunta da VICE Brasil.
Crédito: Divulgação/ Rede TV

A desconfiança era natural: o primeiro debate entre presidenciáveis para o pleito de 2018 havia sido menos que morno, e não havia sinal de que o segundo embate, realizado nesta sexta-feira (17) na Rede TV, seria diferente. Os jornalistas convidados, apartados da plateia geral do debatem em uma sala própria, entupiam-se de Bala Fini e Dadinho enquanto esperavam a TV iniciar o evento – os candidatos haviam passado corridos à frente deles, sem tempo para uma resposta.

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Às 22h se iniciava a contenda, mas ainda sem muito brilho. A única polêmica que parecia ditar o início do evento era sobre um púlpito dedicado à Lula, impedido de participar do debate por estar preso em Curitiba há alguns meses, que foi pedido para ser retirado do debate por todos os candidatos (exceto por Guilherme Boulos [PSOL], que iniciou sua fala lembrando a ausência de Lula).

Porém uma diferença de formato no debate ajudou a dar uma esquentada no clima, pelo menos lá para o final. Além das famigeradas “perguntas do público” e “perguntas de jornalistas”, a Rede TV colocou um palquinho redondo no centro do estúdio para os candidatos se encontrarem e questionarem-se uns aos outros sentindo o bafo de cachaça alheio mais de perto.

Como qualquer rinha de MC, as primeiras batalhas foram as mais chatas – era o de se esperar, não divergência de ideias, mas sim o uso do debate como uma plataforma para cada candidato tentar fazer o espectador conhecer suas ideias, ainda mais enquanto não se inicia o famigerado (e extremamente concentrado) horário político gratuito. Ciro Gomes (PDT), por exemplo, tentou bancar uma dobradinha contra Geraldo Alckmin (PSDB), e acabou se saindo bem: ficou com cara de professor que tenta explicar a complicada matemática da economia nacional, enquanto o ex-governador de São Paulo seguiu nos moldes tucanos de insistir na mensagem de “menos Estado”.

Boulos, por sua vez, usou o candidato e ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) de escada para criticar a política econômica do governo Temer, enquanto Alvaro Dias (Podemos) chamou Marina Silva (Rede) para o palco simplesmente para atacar a candidatura de Lula – a candidata acabou falando mais genericamente de combate à corrupção na sua resposta.

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Jair Bolsonaro (PSL), que costuma ficar à frente nas pesquisas eleitorais realizadas considerando a ausência de Lula no pleito, foi obviamente o mais atacado. Com sua rejeição feminina disparando, o ex-capitão foi questionado até por Meirelles sobre uma declaração de que “não empregaria uma mulher com o mesmo salário de um homem” – frase proferida, ironia das ironias, no programa de Luciana Gimenez na mesma Rede TV.

Mas na medida em que o tempo se esgotava, o clima deu uma esquentada. E, quem diria, o ippon retórico viria da sempre tida como tímida Marina. Chamada por Bolsonaro à responder a última rodada de perguntas. Com uma cola na mão – onde se lia “Lula”, “pesquisas” e “armas” – Bolsonaro seu tempo para atacar o ex-presidente e emendou uma pergunta simples, se Marina seria, como ele, a favor de liberar o armamento civil da população. Marina respondeu com um enfático “não” e foi para cima do deputado federal: “só uma pessoa que não sabe o que significa uma mulher ganhar um salário menor do que um homem, ter as mesmas capacidades e ser a primeira a ser demitida, a última ser promovida, e quando vai para uma fila de emprego, pelo simples fato de ser mulher não é aceita. […] Quando se é presidente da República é preciso fazer valer o artigo 5º da Constituição Federal que diz que nenhuma mulher deve ser discriminada[…].”. Bolsonaro respondeu dizendo “você não sabe o que é uma mulher, Marina, que tem um filho jogado no mundo das drogas para ser a favor de um plebiscito [a favor do aborto]”. Marina zerou o papo de um visivelmente incomodado Bolsonaro com um nocaute: “você fica ensinando pro nosso jovem que tem que resolver as coisas no grito? Você sabe o que a Bíblia diz sobre ensinar uma criança?”, bateu, ainda por cima, lembrou que o Estado brasileiro é laico.

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Assista ao nosso documentário O Mito de Bolsonaro:


Encerrando a contenda, sobraram Daciolo e Boulos, ambos com o ar do coleguinha que era escolhido por último no futebol da escola – enquanto o ex-bombeiro protestou contra a Nova Ordem Mundial e pediu a volta dos votos de papel, prometendo que os brasileiros passariam a sua primeira semana de governo apenas rezando, Boulos alfinetou outros colegas de bancada, chamando Alckmin, Meirelles e Bolsonaro de milionários (Bolsonaro tentou garfar um direito de resposta, mas não conseguiu – afinal Boulos não mentiu: o candidato do PSL declarou R$ 2,2 milhões em patrimônio ao TSE).

Mas foi após o fim do debate que Bolsonaro acabou precisando adotar a tática clássica do Leão da Montanha da “saída pela direita”. Cercado por jornalistas, que esperaram pacientemente ele terminar uma transmissão ao vivo ao lado do senador Magno Malta (PR-ES), ex-cotado a vice do candidato do PSL e cujo partido oficialmente apoia a candidatura de Alckmin, Bolsonaro parecia pouco à vontade. E as perguntas não facilitaram. O primeiro perguntou sobre a declaração de bens do candidato. O segundo, sobre a cola na mão, o que irritou visivelmente Bolsonaro: “o que mais você quer saber? A cor da minha cueca? Vai plantar batata rapaz”. Mas foi a pergunta da VICE que encerrou a entrevista de vez:

VICE: Bolsonaro, o senhor sempre fala do Japão. O senhor acredita que o Japão é um país seguro?
Bolsonaro: Sim.

O senhor pode explicar pra gente como é a política de armamento civil no Japão?
(Virando as costas apressado) […] Estados Unidos! […] Vagabundo! […]

Deixando apressado os estúdios da Rede TV acompanhado de um número substancial de seguranças, Bolsonaro e sua equipe empurraram e xingaram repórteres, e no entrevero quase derrubaram Marina Silva, que dava uma entrevista ao lado. Em silêncio, foi direto ao carro que o esperava, sem explicar que o Japão, país que costuma celebrar pela educação e pujança econômica, tem uma das leis mais severas de controle de armas do mundo. Pelo jeito os próximos meses de campanha ainda podem ser divertidos.

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