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Música

Discos: Milton Henry

Uma Ark espanhola não é com certeza uma Ark jamaicana.

Showcase: Branches and Leaves

Iroko Records

Para quem acha que já ouviu de tudo no enorme espólio dos 70s e 80s do reggae com tendência para o dub, este disco pode ser uma lufada de ar fresco na senda do “mais, mais, mais”. Ou não, se estivermos contentes com as dezenas de discos maravilhosos que foram entretanto reeditados, amén. Voltando ao disco aqui apresentado, Milton Henry prometia: é uma voz que foi ao encontro do estúdio de um mágico que está para o dub como o Copperfield está para o ilusionismo mundial: Lloyd “Bullwackie” Barnes.

The Man Himself

. Mas foi só para dar um jeitinho, para ver se a voz ganha um registo mais ao nível da época de ouro jamaicana, tempos de Dennis Brown, Gregory Isaacs, Wayne Jarrett, Sugar Minnott, Horace Andy, Cornell Campbell, entre tantos outros que não o Bob Marley. Wackies à parte, tenta chegar e por vezes anda lá, pelo menos na pronúncia perfeita, até porque Milton é mesmo desse tempo e da Jamaica, um veterano do rocksteady, que se dava com malta próxima de Max Romeo, por exemplo. Na vida, faltou-lhe sorte, talvez.

O disco começa com um candidato a clássico menor que nos fala da crise mundial — oh pá isso é tão agora - dos nossos tempos: “Crisis”. Que tal como em 70’s, tem logo a seguir uma versão dub: “Crisis Dub”. Escolinha. E aqui vale a pena começar a falar da outra metade operária do disco, quiçá dois terços. Malta espanhola, nuestros parceiros de crise e amor pela Jamaica. Este “Branches and Leaves” é gravado, produzido e misturado por um aprendiz fã de seu nome Roberto Sanchez. Bem batido na área, tanto como músico, como também DJ. Mas aqui, no seu bem intitulado A-Lone Ark Muzik Studio, em Cueto, Espanha, mais perto de Lisboa que Kingston, é mestre do baixo como não podia deixar de ser. Roberto toca também guitarra e teclas na companhia de mais malta espanhola na bateria, sopros e mais percussões. Apesar de ter “Ark” no seu estúdio, com muita pena minha, o Roberto a produzir não é nenhum Lee Perry ou King Tubby, nem mesmo está ao nível do “Bullwackie”, embora se note várias lições estudadas, sobretudo pelo gosto espartano dos arranjos, os graves simples e quase frios. Mas tivesse “Bullwackie” produzido o disco inteiro e não só a voz, não sei se melhoraria a complexidade do dub, mas provavelmente sim. Roberto dá-nos um disco reggae porreiro, competente, distintivamente longe dos clichés do reggae actual, mas para quem gosta mesmo mais de dub, as suas versões têm o senão de soar a apenas bons esforços, estando ao nível de qualquer um outro disco de outras dezenas de há décadas atrás. Mas o que se calhar interessa, é que Roberto deu a Milton um disco à maneira, que merecia ter tido há 30 anos atrás. É isso mesmo. Paz.