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Nos 11 anos da Lei Maria da Penha, verbas diminuem

Enquanto os índices de violência crescem, o repasse de verbas destinado ao atendimento de vítimas diminui.
A enfermeira cearense Maria da Penha, que sobreviveu a duas tentativas de homicídio provocadas pelo marido e deu nome à lei. Foto: Reprodução

Nesta segunda (7), a Lei Maria da Penha, que coíbe e pune violência doméstica contra as mulheres, completou 11 anos de existência. O aniversário, porém, não interrompe o ciclo violento e brutal que os números mostram: uma a cada cinco brasileiras já sofreu violência doméstica cometida por um homem, de acordo com a Secretaria de Políticas para Mulheres. Apesar dos avanços, como a aplicabilidade da lei para mulheres trans e travestis em 2016, o Brasil ainda engatinha na longa estrada de políticas públicas destinadas à causa.

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"Começou com o governo Temer, acabando com o Ministério das Mulheres e transformando-o numa secretaria dentro do Ministério da Justiça", pontua Rosângela Talib, coordenadora da ONG Católicas pelo direito de decidir, que há 14 anos milita pela descriminalização e legalização do aborto. O repasse orçamentário destinado às políticas federais para pautas relacionadas às mulheres, à população negra e aos direitos humanos foi reduzido em 35% pelo governo federal em 2016. Ainda que o Brasil ocupe o quinto lugar num ranking de 83 países com o maior índice de feminicídio, segundo dados do Mapa da Violência 2015.

Na cidade de São Paulo, na qual a sede do Católicas se encontra, o impacto da posse do prefeito João Doria (PSDB) também foi negativo. Apesar de os atendimentos nos Centros de Defesa e Convivência da Mulher (CDCM) crescerem 31% no primeiro trimestre de 2016, o prefeito cortou R$ 3 milhões do orçamento destinado às organizações que atendem as vítimas.

Pronta desde novembro de 2016 na capital paulista, a Casa da Mulher Brasileira, financiada pelo governo federal, segue fechada. "Não tem verba. A casa está pronta, se deteriorando porque não tem profissionais. Não foi destinada verba pra que ela funcione", lamenta Rosângela. "O que temos visto é uma falta de preocupação com a população feminina. De novo. O que é uma grande pena."

Mulheres transexuais e travestis

Apesar de ampliada para mulheres trans e travestis, a efetividade da lei ainda é problemática em seu modus operandi. "Conheço casos de uma pessoa trans ir até a Delegacia da Mulher e o delegado ou a delegada falarem que não poderiam atendê-la porque ela não é mulher", menciona a advogada Ana Carolina Borges, presidente da Comissão de Diversidade Sexual da OAB de Bauru (SP) e membro da Comissão da Diversidade e Combate à Homofobia da OAB de São Paulo. A questão ainda se estende para as delegacias comuns. "Temos enfrentado uma certa dificuldade no atendimento dos delegados com relação às pessoas homossexuais, travestis e transexuais", reitera a advogada.

Para Borges, a lei é excelente. O problema é que ainda não há fiscalização quando, por exemplo, uma mulher está sob medida preventiva — já que, muitas vezes, apesar de denunciar o marido ou namorado, a própria vítima acaba facilitando o acesso do agressor ou volta a se relacionar afetivamente com ele. "O ideal seria um órgão que pudesse fiscalizar melhor essas ocorrência e fazer um acompanhamento não só com a mulher que foi agredida, mas com o agressor. Uma equipe multidisciplinar que acompanhasse esse casal.

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A preocupação se dá pelo fato de o namorado, marido ou ex ser responsável pela maioria dos casos de agressão. De acordo com o relatório "Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil", encomendada pelo Fórum de Segurança Pública em 2017, 61% dos agressores são conhecidos da vítima.

O "Relógios da Violência", iniciativa do Instituto Maria Penha que mostra dados em tempo real, explica melhor o que é conhecido como "Ciclo da violência", formado pelas fases de agressão e reconciliação de um casal

Com a ideia de sanar a violência ainda em sua raiz, tramita em São Paulo um projeto de lei que estabelece a obrigatoriedade do ensino de noções básicas sobre a Lei Maria da Penha nas escolas municipais. Entre os propósitos do PL, de autoria da vereadora Sâmia Bonfim (Psol), figura a iniciativa de "impulsionar a reflexão crítica, entre estudantes, professores e comunidade escolar, sobre a violência contra a mulher".

Para denunciar casos de violência contra a mulher, ligue para a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência. Basta discar 180 de qualquer telefone. Funciona 24 horas.

Para mais informações, clique aqui.

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