Em Paris, Manifestações Pró-Palestina Terminaram em Violência Antissemita

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Em Paris, Manifestações Pró-Palestina Terminaram em Violência Antissemita

Confrontos com a polícia começaram no final do dia, depois que grupos de manifestantes foram até duas sinagogas próximas para enfrentar membros da Liga de Defesa Judaica – uma organização de extrema-direita.

Fotos: Glenn Cloarec / VICE. 

No dia 13 de julho, milhares de manifestantes marcharam do distrito de Barbès em Paris até a Praça da Bastilha, para mostrar seu apoio ao povo palestino e denunciar os ataques israelenses a Gaza. Os confrontos com a polícia começaram no final do dia, depois que grupos de manifestantes foram até duas sinagogas próximas para enfrentar membros da Liga de Defesa Judaica – uma organização de extrema-direita.

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As autoridades francesas decidiram então proibir um novo protesto de apoio a Gaza, planejado para o fim de semana passado em Barbès – uma área tradicional da classe trabalhadora no norte de Paris. Apesar da proibição, os organizadores – que incluíam o partido de extrema-esquerda NPA e as organizações Europalestine e Indigènes de la République – insistiram em marchar. Participando da manifestação estava o político sul-africano Ronnie Kasrils, conhecido pelas críticas ao governo israelense.

Por volta das duas da tarde, centenas de manifestantes começaram a se reunir na avenida, que estava cercada por caminhões da tropa de choque. No começo, as pessoas gritavam, pacificamente, frases como “Palestina viverá, Palestina vencerá”, “Sionistas, fascistas, vocês são terroristas!” e “Israel assassina, [presidente] Hollande cúmplice”, mas as coisas começaram a ficar tensas quando algumas bandeiras israelenses foram queimadas no topo de um prédio próximo. Os organizadores tinham pedido que os manifestantes trouxessem apenas bandeiras palestinas e da França, mas muitos exibiam símbolos argelinos, turcos e da Irmandade Muçulmana. Enquanto a marcha se preparava para sair, os gritos de “Allahu akbar” foram ficando mais frequentes e um jovem levantou uma bandeira do ISIS. Ao mesmo tempo, para desespero dos manifestantes não babacas, uma equipe de jornalistas do canal francês Télé teve que deixar o local depois de ser ameaçada por vários indivíduos.

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“Israel controla a mídia”, disse uma adolescente. “Os jornais mentem para o público sobre o que está acontecendo na Palestina. Estamos aqui para mostrar nosso apoio aos palestinos e para nos opor aos crimes e mentiras dos sionistas. Ninguém vai nos impedir, muito menos Hollande, que parece desesperado em nos calar”, ela continuou.

Quando a manifestação chegou ao distrito de Chateau Rouge, por volta de quatro da tarde, os milhares de manifestantes toparam com um grande número de policiais. Foi aí que as coisas começaram a degenerar: manifestantes começaram a jogar objetos e a polícia respondeu com bombas de efeito moral e muito gás lacrimogêneo. Para combater os efeitos do gás, os manifestantes lavavam os olhos com leite e soro fisiológico. Enquanto muitos fugiam do local ou tentavam acalmar as coisas, outros jogavam pedras na polícia e logo se juntaram a um grupo cuja principal preocupação era enfrentar a “polícia sionista”. Alguns decidiram então que era uma boa ideia roubar e atacar alguns jornalistas, incluindo o cinegrafista da VICE Gaspard Glanz.

Os manifestantes construíram barricadas com latas de lixo em chamas e quebraram o pavimento para fazer mais projéteis. O Hospital Lariboisière foi atacado, dois caminhões da operadora de transporte público estatal RATP foram virados e incendiados, e várias lojas tiveram as fachadas destruídas. O confronto durou quase três horas, destruindo todo o bairro e resultando em dezenas de feridos – entre eles 17 policiais. As autoridades anunciaram a prisão de 44 manifestantes sob acusações de violência e danos agravados.

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No fim do dia, a polícia ficou sem munição. Eles tentaram então retomar o controle chamando unidades dos subúrbios de Paris como reforço. De acordo com um manifestante que estava tirando fotos dos enfrentamentos, a situação piorou porque a polícia “estava do lado dos judeus, donos de todas as lojas da área”.

Por volta de sete da noite, passando a estação de metrô Barbès, vi dois amigos tirando fotos imitando o gesto “quenelle” – que é visto por muitos como antissemita – em frente a uma dupla de policias exaustos. Um dos policiais se virou para o colega e disse que fazia muito tempo que ele não via uma manifestação tão violenta em Paris.

Na tarde de domingo, outro protesto pró-Palestina foi organizado na cidade de Sarcelles – lar de uma grande comunidade de judeus sefarditas. Como no caso de Paris no dia anterior, esse protesto também tinha sido proibido.

Confrontos entre a polícia e os manifestantes começaram em frente à sinagoga da cidade, carros e delegacias de polícia na região foram incendiados e muitas lojas e farmácias foram atacadas. Os helicópteros continuavam sobrevoando a área no começo da noite, mesmo quando as coisas já começaram a se acalmar.

François Hollande declarou que “a habilidade da República é coexistir harmoniosamente […] e não ser arrastada por conflitos que estão muito longe para serem importados”, mas cada vez mais judeus franceses – que estão sendo automaticamente categorizados como israelenses por alguns manifestantes nas últimas semanas – estão começando a questionar seu futuro no país.

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Numa entrevista para o site pró-Israel lemondejuif.info, Roger Cukierman, presidente da filial francesa do Congresso Judaico Mundial, disse que “esse tipo de novo antissemitismo pode levar à partida de todos os judeus”. Pode parecer exagero, mas não há dúvida de que esses protestos violentos vão ficar marcados na memória tanto da comunidade judaica francesa como na dos ativistas pró-Palestina não racistas.

Um vídeo mostrando o protesto será publicado em breve na VICE.com.

Tradução: Marina Schnoor