ilustração de duas pessoas a beijarem-se
Ilustração por Charlotte Mei.

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Viagem

Falámos com pessoas cegas sobre como sentem a atracção sexual

“O meu cérebro decide em cinco segundos se gosto ou não de uma pessoa”.

Este artigo foi originalmente publicado na VICE UK.

A atracção sexual costuma ter uma componente visual. Mesmo que te consideres a pessoa menos superficial do Planeta e digas às pessoas que conheces em bares que estás à procura de alguém com quem possas estabelecer um vínculo sentimental profundo, ainda apostaria que a razão que te levou a te aproximares dessas mesmas pessoas em bares foi, em parte, pelo seu aspecto físico.

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Então, como é que isto acontece com as 255 mil pessoas que estão registadas como cegas no Reino Unido? Claro que há outros elementos comuns a todos os que nos influenciam na altura de nos apaixonarmos com o tempo. Mas, o que é que substitui esse instinto selvagem de atracção que, para muitas pessoas, se baseia exclusivamente nos olhares?


Vê: "O caçador completamente cego"


Para tentar descobrir, falei com o escritor de viagens Tony Giles, a artista e culturista Claire Lawrence, a vlogger de beleza Lucy Edwards e a atleta Selina Litt, todos eles invisuais.

Selina Litt

selina litt

"Os cegos não podem admirar a beleza de alguém do outro lado da sala, nem estabelecer contacto visual, nem ler a linguagem corporal. Isto significa que precisamos de interacção directa com uma pessoa antes de nós podermos sentir sexualmente atraídos por ela. Umas das ideias erradas que se tem sobre nos é que tocamos na cara das pessoas para identificar as suas feições e decidir se gostamos ou não. Isso não é assim. Para mim, a atracção sexual baseia-se, principalmente, no instinto. O meu cérebro decide se gosto ou não de uma pessoa em cinco segundos.

Faço uma imagem mental de como acho que essa pessoa pode ser. Posso não acertar em nada, mas não tenho forma de o comprovar. É como quando falas com alguém por telefone e imaginas como essa pessoa é. Apesar de não a poder ver fisicamente , a imagem mental que tenho dela influencia a maneira como a sinto.

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Costumo sentir-me atraída por pessoas mais altas que eu, se bem que só meço um metro e 60, por isso não é complicado. Gosto muito de desporto, portanto tendo a preferir pessoas que partilhem um estilo de vida mais saudável. Para além disso, sou formada em Inglês, pelo que gosto de homens que dominem a língua de forma eloquente. Os homens podem parecer-me mais atraentes se usarem um after-shave ou um gel de banho que cheire bem, porque suponho que o cheiro também influencie até certo ponto".

Tony Giles

"A mim, sexualmente, atrai-me a personalidade das mulheres. Atrai-me o que dizem, a sua voz, sotaque, etc. Alguns sotaques regionais parecem-me mais atraentes que outros. O sotaque 'Brummie' (de Birmingham), por exemplo, não me atrai nada!

O contacto físico costuma desempenhar um papel mais dominante na atracção sexual para as pessoas cegas. Presto atenção à suavidade da pele e ao toque do cabelo, especialmente se é comprido. Quando fantasio, a minha mente cria imagens visuais e penso em mulheres com cabelo escuro. Isto pode ser porque, apesar de ter nascido cego, quando era pequeno conseguia ver imagens a branco e preto.

Normalmente, vou agarrado ao braço de alguém para que me guie e consiga perceber a sua altura, peso e estatura óssea. As mulheres com os braços magros e com a cintura estreita parecem-me menos atraentes que aquelas com mais curvas. Também gosto do toque de certos tecidos em mulheres. As texturas suaves são mais estimulantes. Gosto do toque da seda ou do cetim, das rendas e do cabedal. O barulho dos saltos altos também me atrai.

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Acho que há gente que assume que os cegos não sentem atracção sexual. Tretas. Estive numa relação sexual durante nove anos e há pessoas cegas em todo o Mundo que têm relações felizes e excitantes".

Claire Lawrence

claire lawrence bodybuilder

"Um homem que cheire bem e tenha a voz bonita é extremamente atraente. Sou uma pessoa muito táctil, confio no tacto para estabelecer como são as coisas, incluindo os corpos. Sou culturista, por isso gosto de homens fortes. Quando era mais nova nunca me teria encantado por um rapaz desportista ou interessado em fitness mas, agora que sou atleta, esse é o tipo de pessoas que prefiro, porque partilhamos interesses. Para além disso, sinto-me mais atraída por um corpo em forma - mas, quem não?

Costumo gostar de elementos físicos de outras pessoas que também estejam presentes no meu próprio corpo. Gosto dos meus ombros, das minhas costas, dos músculos das minhas pernas. Se vou dormir com alguém, quero que seja tão bom como eu, ou mais.

O cheiro das pessoas também me faz conectar com elas. Um perfume pode excitar-me ou ter o efeito oposto; algumas colónias para homem provocam-me náuseas. Treino diariamente no ginásio e, muitas vezes, há homens que cheiram bastante mal. Até podem ser o Idris Elba, mas se cheiram assim, a resposta é: não, obrigada".

Lucy Edwards

Lucy Edwards

"Conheci o meu noivo, Ollie, antes de perder a visão, por isso sei como é que ele é, mas a natureza da minha atracção sexual quanto a ele mudou desde que sou cega. Agora, baseia-se mais num nível emocional. Gosto das conversas de engate e o cheiro também é um factor muito importante. Adoro que ponha um after-shave depois de fazer a barba, que cheire bem, bem como o odor das camisolas quando as lava com amaciador de lavanda.

No que toca aos famosos, há vozes que me parecem atraentes e digo sempre ao Ollie que gosto dos actores com sotaque irlandês. Também tenho mais em conta a opinião da minha irmã, confio nela para me dizer se um famoso é giro ou não. Há pessoas que assumem que as mulheres cegas podem gostar de qualquer um, porque não conseguem ver, mas não podiam estar mais enganadas. Nos últimos anos, quando me abordam em bares, às vezes penso se o estão a fazer porque acham que por ser cega sou mais fácil. E isso não é assim".


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