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cinema

Aborreci-me de morte com o Under the Skin

Uma fábula futurista que não diverte minimamente.

O problema da maioria dos realizadores da escola do videoclipe passa muitas vezes por acreditarem que essa fórmula de alguns minutos pode ser ampliada até ao ponto da longa-duração. Quer dizer, poder até pode, mas o mais certo é que muitos de nós morramos de overdose de estilo (no fundo, o oxigénio de um vídeo) antes que o filme termine. Enquanto criador (e pensador progressista) de videoclipes, Jonathan Glazer fez-nos acreditar nas suas brilhantes visões de situações paranormais e de realidades fenomenais, tão detalhadas e consistentes como a nossa, mas todas essas representam garantias que, aos poucos, vão sendo desgastadas pelo aborrecimento cíclico de Under the Skin (aquando da sua estreia vendido como se fosse o Messias de uma nova e estrondosa vaga). "É suposto tomarmos banho neste lago badalhoco?" Convenhamos, ainda assim, que esta história de um ser alienígena (Scarlett Johansson em modo Terminator) aterrado na Escócia para cumprir uma qualquer missão de reconhecimento e abdução, encaixa perfeitamente no imaginário e na linguagem visual de Jonathan Glazer, que, para o efeito, não se acanha sequer de aproveitar algumas das boas referências deixadas pelo muito semelhante The Man Who Fell to Earth (filme superior, embora também defeituoso), de Nicolas Roeg. Contudo, todo o empenho que Glazer coloca na construção de alegorias fantásticas e de uma atmosfera de medo não chega para manter o fôlego de um filme, que tantas vezes parece preso num único loop: a extraterrestre atrai sexualmente as suas vítimas, da mesma maneira que faria um homem de leste, ao volante de uma carrinha num animado porn gonzo, sendo que o acto nunca chega a ser consumado (porque as vítimas da primeira são absorvidas por uma espécie de lodo mágico, onde os homens são apenas matéria para alimentar uma entidade). “Tens a mania que és o McNamara e depois acontecem estas merdas…” O twist surge no momento em que o esbelto ser do outro mundo (uma Scarlett Johansson mais roliça do que o habitual) dá boleia ao filho do Homem Elefante. É aí que a nossa protagonista totalmente impiedosa esbarra com as exigências de ter uma sensibilidade humana (até porque é possível que tenha sido a piedade a conceder a libertação excepcional desta sua última vítima aberrante). Portanto a criatura que dedica dois terços do filme à caça de humanos passa o último (e o melhor) terço a fugir da humanidade que descobriu em si (porque entretanto também reparou que tinha uma certa parte mais erógena e capaz de magnetizar os homens). Esse lado de fábula futurista, que é inerente a Under the Skin, terá a sua dose de interesse e a vantagem de espicaçar múltiplas leituras, mas Jonathan Glazer, apesar de todos os esforços, está longe de ser um Lynch, quanto mais um Kubrick, e este seu último filme morre sobretudo nos mil bocejos que provoca.